quarta-feira, 3 de novembro de 2010

And I found him - set/2009


Há alguns dias estávamos combinando nosso primeiro encontro. Eu sempre prometia, mas, quando chegava a hora H, acabava dando uma desculpa para não vê-lo. Não sei se era nervosismo, ansiedade, medo da expectativa inicial ser maior do que o resultado final, enfim, fugia da minha palavra. Sabia que ele estaria me esperando, independentemente de quando a minha coragem aparecesse.

No começo da semana tomei a decisão: ir ao meu belo destino na sexta-feira. Dessa vez prometi a mim mesma que não haveria falha, afinal todas sabemos que, se dificultamos demais, a vontade vira uma nuvem de ilusão e vai embora.
Chegou o grande dia. Despertei com os raios de sol atravessando as cortinas e penetrando na minha camera: exatamente sete horas da manhã. Sem pensar duas vezes, levantei-me e comecei a me aprontar. Era um daqueles dias em que se arrumar dá gosto. O legítimo dia em que, por mais que tenhamos uma causa especial, conquistar a si própria é fator fundamental. Jeans, blusa básica, cabelos soltos, perfect shoes, aquele anel, a blue flower - só pra dar aquele toque-.

Durante o trajeto começava a surgir aquele friozinho na barriga. A hora mais longa da minha estada na Itália. A cada estação em que o trem parava, olhava pela janela para ver se já havíamos chegado ao destino. Revisava os mapas sem parar: queria ter certeza de que não erraria o caminho até ele, por mais que o tivesse decorado em minha mente ao longo dos dias de espera.

Na chegada não perdi tempo. Segui com precisão todo o trajeto estabelecido. Parecia que, quando mais me aproximava, mais ouvia ele me chamar. Estaria ele tão ansioso quanto eu? Simplesmente não via a hora. Meus passos eram longos e ágeis, e em cerca de dez minutos lá estava eu.

Nosso local de encontro era tipicamente europeu: um museu. Graças a minha exímia pontualidade, não precisei encarar filas nem visitantes desagradáveis: não queria crianças chorando, muito menos japoneses intrometidos fotografando aqueles que seriam os meus momentos com ele.

Quando entrei me deparo com algo que eu não esperava: uma exposição fantástica de Robert Mapplethorpe -famoso fotógrafo nova-iorquino- “La perfezione nella Forma”. Fotografias peculiares, de ângulos diversos, em preto e branco, de corpos nus. Seguindo a indicação do título, tive a impressão que o acervo era basicamente uma preparação, por assim dizer, para a tentativa de compreensão do pensamento que estava sendo gerado na mente dos artistas renascentistas há mais de 500 anos atrás ali na mesma cidade. Um exercício para o olhar, que ao fim, capacita-nos de concluir que, sim, o homem é um ser perfeito em suas formas e intelecto e é o centro do universo.

Sai da galeria totalmente fascinada. Minha mente estava pronta para entrar no mundo renascentista com toda vontade, como se fosse uma nova página, clara sem nenhum vestígio de cotidiano, quando de repente vejo “ele”. Fui pega de surpresa, não esperava. Esses italianos sabem mesmo como conquistar.

Ele era tudo o que eu esperava e mais um pouco. Alto – daqueles com os quais se pode usar qualquer salto alto sem se sentir a maior mulher do mundo-, cabelos ondulados em um corte levemente bagunçado – tudo que qualquer uma sempre quis-, com um rosto lindo de dar inveja, um corpo perfeitamente esculpido, e uma pele clara como a neve. Seus olhos eram serenos e atentos ao horizonte, sua expressão de tranqüilidade definia as maças da face, porém seus lábios eram cerrados, deixando no ar uma onda de mistério. Os músculos eram tensos, apesar de seus movimentos serem leves. Percebiam-se as veias em seu antebraço direito, como se tivesse feito força em um momento anterior. Seguindo a lógica do conjunto, poderia aderir uma respiração ofegante ao bello, daquelas obtidas após um momento tenso. Após uma longa observação e avaliação do perfil da “obra-prima da natureza”, percebi que ele era, além de tudo, um jovem vitorioso, realizado, orgulhoso de si e de seu caráter. Ah sim, seu nome: Daví – filho legítimo de Michelangelo-.

Ficamos juntos por volta de 1 hora. Não cansava de admirá-lo. Daví é realmente fantástico, praticamente uma perfeição. Però, é um pouco quieto, não gosta muito de falar. Além disso, é um homem muito concorrido. O legítimo partido que, se a mulher é ciumenta, não pode nem cogitar, pois as concorrentes não tem vergonha de olhar.

Deixei a Galleria dell’Accademia por volta do meio dia. Que manhã maravilhosa. Combinamos de nos encontrarmos novamente no começo de outubro, quando farei outra visita a Florença. Mal posso esperar.

Isabella Barbieri